Por Romeu Duarte
Ensina o dicionário que vício, substantivo
masculino, significa disposição habitual para certo mal, mau costume, ação
indecorosa ou libertina, imperfeição grave ou defeito, tendo como sinônimos
pecado e perversão. Derivado do latim vitium,
geralmente correspondendo a falha, constitui-se num hábito repetitivo que
degenera ou causa algum prejuízo ao viciado e aos que com ele convivem, tendo
como antônimo, ou oposto, a virtude. Péssimos adjetivos são costumeiramente
dispensados a quem desenvolve tais reprováveis rotinas, sendo este, no limite, afastado
pela sociedade de suas relações. O degenerado acaba não tendo outro destino
senão o de pária, o excluído de todas as rodas, os dedos apontados ao cachimbo
que faz a boca torta.
Sem querer dar uma de Émile Zola, apenas
registrando alguns aspectos que me parecem, neste particular, dignos de nota
nesta nossa mais que sofrida cidade, refiro-me a alguns comportamentos
reprováveis, quiçá já se transformando em sombria tradição. Não, não me refiro
à renitente roda de baralho da Barão do Rio Branco com São Paulo, movida a café
e cigarro, ou ao troca-troca alucinado de figurinhas da Copa nas bancas de
revista. Inicio pelos modos e maneiras de nossas maiores torcidas
uniformizadas, em seu obstinado afã de destruir seus times e, de roldão, o
futebol cearense. Ah, com que prazer se esmeram, alvinegros e tricolores de
camisas a serviço do capeta, em fazer do pebol alencarino uma batalha sem
quartel e afugentar dos estádios os verdadeiros torcedores, aqueles pacíficos.
Claro que não vou me ocupar aqui da radical
lourificação das mulheres fortalezenses (Iracemas pós-pós-modernas lutando
contra o relógio?). Na mesma linha, nenhuma palavra sobre a destruição de
nossas lídimas manifestações culturais, já que nada mais up-to-date do que uma tapiocaria gourmet aninhada sob os escombros da Chácara Flora. Prefiro
denunciar o truculento modus operandi
de nossa gloriosa polícia reservado a manifestantes com causa e, de forma
especial, aos nossos destemidos jornalistas, comprometidos com a tarefa
diuturna de revelar-nos a realidade. Em suma, a sola assola, come de esmola,
faz escola e amola o gume da aguda apartação social. Por certo, a droga é a
causa de inúmeros males, os quais não serão resolvidos somente pelo intenso
brilho das caras Hylux novas em folha.
Curiosos olhos sobre meus ombros pedem-me
para inventariar as manias feias dos moradores da Loura. Dentre outras, vá lá:
os motoristas ronceiros, useiros e vezeiros em estacionar na calçada, andar
devagar, segurando fila de carros com o celular na orelha, e fechar cruzamento;
o político grosseiro e ainda influente, mesmo na descida da rampa, a
desqualificar adversários e correligionários com palavrões vindos dos seus maus
bofes; o emporcalhamento de caso pensado da cidade por seus habitantes, todos
acólitos do deus Lixo; combinado, nenhuma palavra quanto aos tratamentos rústicos
e incivilizados que ainda abundam em nosso meio (quando o século XVIII dará
adeus ao Ceará?), o brucutu aos berros navegando na internet; o vezo
adversativo do povo, o qual atesta que o rapaz é gente fina, mas...
É tanta coisa ruim que eu vou dizer...
Agora, aqui para nós, a pior de todas, já se perpetuando como uma
característica de nossas infelizes administrações municipais, é esse negócio de
intervir na cidade sem qualquer tipo de planejamento prévio, de realizar obras
ao bel prazer de gerentes iluminados, desconsiderando o conhecimento, a
inteligência e a sensibilidade e, por que não dizer, o direito que todos temos,
como cidadãos pagadores de impostos, de analisar, criticar e propor o que se
pretende fazer como melhoria urbana. Fortaleza está em pé de guerra e não é só
porque os black-blocs estão pintando de preto o Benfica ou pelo fato dos emos
se acorrentarem às árvores da ameaçada Praça Portugal. Há por parte da
população um franco desejo de participar e colaborar para dar um rumo a esta
urbe. Que este não seja desperdiçado.
Fonte: jornal O POVO de 26 de maio de 2014.