segunda-feira, 28 de julho de 2014

POBRE LÍNGUA RICA

 Por Romeu Duarte


A morte de um escritor desperta em seus leitores um lamento pleno de saudade e reconhecimento. Sua voz calada, sua escrita bruscamente interrompida representam, além da perda e do luto para aqueles que o pranteiam, uma indagação à língua e à literatura: como estas seguirão adiante sem a sua contribuição? Neste surpreendentemente aziago julho, já em seus estertores, perdemos não só um, mas três autores de muito boa cepa. Pela ordem cronológica de partida, Ivan Junqueira, João Ubaldo Ribeiro e Ariano Suassuna. Todos, cada um a seu modo, intérpretes do Brasil, do seu povo, dos seus falares, mestres em prosa e rima, o erudito e o popular como faces da mesma mestiça moeda. Todos acadêmicos, no que essa palavra ainda tem de bom. Imortais, mesmo assim o chão os engoliu.
Poeta e tradutor, Ivan Junqueira quase foi médico e filósofo. Para muitos, um poeta de poetas, culto e refinado, infelizmente pouco lido, entretanto multipremiado. Tradutor de Baudelaire, Leopardi e Eliot, fui à obra poética deste último gigante introduzido por um grande trabalho seu, “Poesia”, o prazer de saborear os Quatro Quartetos em meio à Terra Desolada. Sucedendo a João Cabral de Melo Neto, ocupava desde 2000 a cadeira 37 da ABL, que tem como patrono o árcade Tomás Antônio Gonzaga e Silva Ramos como seu primeiro ocupante. Canta, bardo, tua canção bela e doída: “...Foram damas tais ossos, foram reis e príncipes e bispos e donzelas, mas de todos a morte apenas fez a tábua rasa do asco e das mazelas. E aí, na areia anônima, eles moram. Ninguém os escuta. Os ossos choram”.
João Ubaldo nunca deixou de ser o morador despreocupado da ilha de Itaparica, nu da cintura para cima, calção frouxo, a gaiola com o curió numa mão e o copo de cana na outra. Sucedendo a Carlos Castello Branco, respondia desde 1993 pela cadeira 34 da ABL, cujo defensor é Sousa Caldas, tendo sido Pereira da Silva seu primeiro usuário. Polígrafo, fez também seus personagens e tramas apimentadas incursionarem com sucesso pela televisão, cinema e teatro. Ganhador do Camões em 2008, o mais importante prêmio literário do idioma português, dele disse seu colega de academia Antônio Olinto: “Mas como falar deste país sem o lanho do humor? Em tudo insere João Ubaldo a visão do humorista, que vê o que não aparece, identifica a nudez das gentes, entende os pensamentos ocultos”.
Ariano Suassuna foi o inventor do Nordeste armorial, ponta-de-lança da cultura do agreste e da zona da mata, protetor perpétuo do ôxente nas refregas deste contra o ok. Último dono da cadeira 32 da ABL, protegida por Manuel de Araújo Porto Alegre e inaugurada por Carlos de Laet, substituiu Genolino Amado em 1989. Famoso pelas freqüentadas e polêmicas aulas-espetáculo, nas quais defendia ardorosamente seus pontos de vista (para alguns, reacionários) com um sonoro e provocante sotaque pernambucano da gema, influenciou um sem número de artistas, fazendo tanto discípulos quanto contrários. João Grilo medievalmente doente pelo Sport, crítico do país dividido entre privilegiados e despossuídos, dizia: “Arte para mim não é produto de mercado. Podem me chamar de romântico. Arte para mim é missão, vocação e festa”.
Esse triste cortejo fúnebre de defuntos craques da pena lança luzes sobre uma misteriosa e mais que centenária instituição, a Academia Brasileira de Letras. Fundada em 1897 por Machado de Assis e por gente do naipe de um Joaquim Nabuco e de um Rui Barbosa, o velho sodalício hoje atravessa um mau momento, marcado por sua irrelevância na vida cultural brasileira, pelo seu anacronismo e, lamentável, pela presença em seus assentos de vários membros destituídos da mínima qualificação literária. Antes que Veronika decida morrer, picada por marimbondos de fogo, e que o feitiço se volte contra o feiticeiro, quem viver verá: as três vagas abertas irão atiçar a cobiça de mil bichos-literatos de unha e orelha, de poucas letras e muita empáfia. Teremos mais uma infausta surpresa na Casa do Bruxo do Cosme Velho?

quarta-feira, 23 de julho de 2014

DE CIMA DO PÉ DE CAJARANA


Por Romeu Duarte

Se todo brasileiro tem entranhado, no corpo e na alma, um técnico de futebol cheio de manha e sacadas, em tempos de Copa do Mundo, e ainda mais, realizada no Brasil, essa mania eleva-se ao paroxismo. Mesmo atolado até as orelhas em trabalho, o cidadão sempre encontra tempo para matutar acerca da qualidade da seleção, dos jogadores que estão bem, dos que estão devendo, daqueles que poderiam entrar, dos que não foram convocados. No terminal, enquanto o ônibus não chega, a discussão sobre a melhor escalação, os nomes mais adequados para cada posição, quem deveria ir para o inferno só com passagem de ida. Já dando bandeira de ser portador da mesma síndrome e doido para meter a minha colher no angu verde-e-amarelo, estou aqui num pé e noutro com a solucionática para a problemática.

Salvo pela própria agilidade e por uma trave redentora, com a voz embargada pelas lágrimas de esguicho, Júlio César recuperou a confiança nacional após a batalha contra o Chile, aquela que quase nos mata de enfarte. Os dois laterais, Daniel Alves e Marcelo, sofríveis, não apóiam ou marcam como deveriam, deixando feéricas avenidas escancaradas em seus setores à mercê dos adversários. São apenas pálidas reproduções de si próprios no Barcelona e no Real Madrid, respectivamente. O duo de zaga, Thiago Silva (o capitão chorão) e David Luiz (este o verdadeiro líder), tem se havido satisfatoriamente, o que há muito não existia no nosso escrete. Mesmo assim, vez ou outra, batem cabeça. Saudades da fibra e da autoridade de um Carlos Alberto Torres, o capitão do tri, a chibatada seca selando o destino da Itália na final.

Nosso meio de campo é uma plantação de pepinos. Antes povoado por figuras cerebrais, geniais, infernais tais como Clodoaldo, Gerson, Rivelino e Paulo César Caju, organizadores de bloqueios, tramas e lançamentos, hoje, neste vasto latifúndio improdutivo, não há um cristão que chame para si a responsabilidade de tocar a bola, pará-la ou imprimir velocidade a ela quando se faz preciso. Paulinho, Oscar, Ramires, Fernandinho, Willian, uma chusma de volantes que adoram se esconder na hora do sapeca-iaiá. A exceção é Luiz Gustavo, cabra disposto que não perde a viagem nem enjeita serviço. Hernanes, uma boa opção ainda não testada. A bola está saindo direto do goleiro para o ataque sem passar pelo crivo dos homens da meia-cancha. Estariam fazendo falta Ganso, Kaká, Ronaldinho Gaúcho?

Lá na frente a coisa anda engrossando. Nesse setor atua nossa principal referência futebolística atual, Neymar, de quem, sozinho, sem ter com quem dialogar, a Canarinha tem dependido bastante. Daí a mão de peia que o garoto leva em cada partida. Até agora tem conseguido se safar, apesar do sumiço (junto com quase todo o time, aliás) no segundo tempo do último jogo. Fred tem sido uma decepção. Feito uma parede, a bola bate em seu peito e volta ao ponto de origem. Não joga sem bola nem abre espaços para a criação de jogadas. Hulk, o boi-de-piranha, tem ido decidido para o sacrifício, a perna direita só servindo para subir nos lotações de São Petersburgo e nada de afunilar para receber lances de profundidade. Ah, Rei Pelé, em qual desvão perdeu-se o teu exemplo, ou o de um Tostão, de um Jairzinho?

Resultado: uma ruma de boleiros, na linha média do gramado, sem saber o que fazer. A Amarelinha precisa largar mão dessa imagem de frita-bolinho e jogar como o fez na Copa das Confederações, um dos poucos momentos em que ela me encheu os olhos nos últimos anos. Proposta: aliar a criatividade e a irreverência brazucas aos rigores do futebol total. Escrevo esta crônica antes de Brasil x Colômbia, o risco que corre o pau, corre o machado. Ato falho: analisando a nossa pátria onzena, acabei homenageando o time de 1970, para mim o melhor de todos. Fato: o pebol de Pindorama é patrimônio universal, nos afirma como nação, é celebração, forma de expressão, saber e ofício e seu lugar é no coração do povo, para quem, como dizia Nelson Rodrigues, a mais sórdida pelada é de uma complexidade shakespeariana.

terça-feira, 22 de julho de 2014

RADICALIZAR A DEMOCRACIA






Por Joaquim Cartaxo

Por meio do decreto n° 8.243/2014, a presidenta Dilma Rousseff instituiu a Política Nacional de Participação Social (PNPS) com o objetivo de “fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil.” São considerados também objetivos e diretrizes da PNPS a formulação, execução, monitoramento de programas e políticas públicas e aprimoramento da gestão pública.
Tais mecanismos e instâncias de participação social são os seguintes, relacionados e definidos no decreto presidencial: sociedade civil, conselho e comissão de políticas públicas, , conferência nacional, ouvidoria pública federal, mesa de diálogo, fórum interconselhos, audiência e  consulta pública, ambiente virtual de participação social. Há tempos, todos funcionando de uma forma ou de outra na formulação, execução, monitoramento e aprimoramento das políticas públicas.
 Com a PNPS, a participação social é reconhecida como direito do cidadão e adotada como método de governo; os instrumentos de democracia representativa, direta e participativa se integram, se articulam e devem ser acessíveis aos grupos sociais historicamente excluídos; os valores de cidadania e inclusão social são construídos com base na solidariedade, cooperação e respeito à diversidade cultural, étnica, sexual, religiosa dentre outras; valoriza-se a educação para a cidadania ativa; amplia-se os mecanismos de controle social nas políticas e programas de governo; aprimora-se a relação do governo federal com a sociedade civil; estimula-se a participação social nos entes federados; assume-se compromisso de responder às propostas recebidas.
Governo e sociedade civil, portanto se encontram diante do desafio e oportunidade de fazer funcionar de forma sistêmica e ativa os mecanismos e instâncias mencionados,  de modo a radicalizar a democracia brasileira.

Fonte: jornal O POVO de 22/07/2014


segunda-feira, 21 de julho de 2014

“Pior do que inflação é desemprego alto e arrocho salarial”.






 Carolina Oms entrevista Ricardo Berzoini


A persistência da inflação próxima do teto da meta de 6,5%, combinada com uma expectativa de crescimento de apenas 1% no PIB brasileiro, neste ano, levou a economia para o centro do debate eleitoral. Diante desse quadro, o ministro das Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, diz que o governo deve evitar que a política monetária seja usada “de maneira demasiada” durante as discussões dos próximos meses. Engenheiro, nascido em Juiz de Fora, que começou a carreira política no Sindicato dos Bancários de São Paulo, Berzoini é também deputado federal, foi ministro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e é um dos coordenadores da campanha de reeleição da presidenta Dilma Rousseff. Na visão do ministro, o governo não deve cuidar apenas da inflação. “Além de olhar para juros, câmbio e contas, o governo tem metas de emprego e renda dos trabalhadores”, diz Berzoini nesta entrevista à DINHEIRO.

DINHEIRO – Existe um projeto em tramitação no Senado que prevê a autonomia formal do Banco Central (BC). O governo vai apoiá-lo?
RICARDO BERZOINI –
Não. Não existe nenhum espaço no Poder Público que possa ter autonomia absoluta em relação à soberania popular, que é o voto. O Banco Central tem de ter certo grau de independência técnica. Mas a pergunta que se coloca é: independente de quem?

DINHEIRO – Em junho, a inflação estourou o teto da meta, de 6,5%. O governo se conformou com uma inflação acima de 6%?
BERZOINI –
Não. O governo busca o centro da meta, mas há duas maneiras de se tratar a meta da inflação. Uma é tratar como objetivo único da economia. Outra é tratar a meta combinada com outros objetivos como emprego, renda dos trabalhadores, crescimento econômico, investimento público e privado. Se o governo pudesse trazer a inflação para 4,5% ao ano, traria, mas temos uma série de pressões inflacionárias. Se você usar a política monetária de maneira demasiada, vai provocar uma recessão. É importante ter um olho na inflação e outro na geração de emprego e renda. A inflação incomoda os trabalhadores. Mas, para o trabalhador, pior do que inflação é desemprego alto e arrocho salarial.

DINHEIRO – Alguns analistas dizem que o atual cenário de crescimento baixo e inflação alta pode levar a uma “estagflação”...
BERZOINI –
É um exagero falar em estagflação. Estamos em uma luta com duas metas. Uma é levar o crescimento mais para cima; a outra é trazer a inflação mais para baixo. Por que o Brasil não cresce? Estamos vivendo um cenário de desaceleração na Ásia, de recessão na Europa, e os Estados Unidos estão em lenta recuperação. Não é fácil crescer nesse cenário. É muito diferente de seis, sete anos atrás, quando havia uma conjuntura internacional melhor, da qual a política econômica interna pôde se aproveitar.

DINHEIRO – Na política econômica interna, houve desonerações, pacotes de concessões e de incentivos à indústria. E mesmo assim não foi suficiente.
BERZOINI –
O governo agiu para preservar a competitividade, como fez com a desoneração da folha de pagamentos. Existem dois modelos para obter o retorno da competitividade. Há gente, que está assessorando candidatos à Presidência, dizendo que precisamos acabar com o ganho real de salário mínimo ou que é necessário aumentar o desemprego. Quem diz isso quer jogar a conta para o trabalhador. Nós procuramos fazer movimentos tributários ou de incentivo de crédito para permitir maior competitividade, sem jogar a conta para a população.

DINHEIRO – A confiança é outro componente importante do crescimento e ela está bastante baixa. Há um problema no diálogo do governo com o empresariado?
BERZOINI –
Uma parte dessa desconfiança se dá fundamentalmente com o cenário mundial, onde houve queda na demanda e aumento da competição. A relação entre o governo e o empresariado é de altos e baixos. Recentemente, a presidenta Dilma Rousseff reuniu o setor industrial no Palácio do Planalto para anunciar medidas como a prorrogação do Reintegra, que aumenta a competitividade, e a reação foi muito boa. O que faz o empresário investir é a possibilidade de lucro. A presidenta tem inaugurado várias obras logísticas que buscam a retomada do crescimento.

DINHEIRO – Então as medidas que podem impulsionar o crescimento já estão sendo tomadas?
BERZOINI –
Evidentemente, sempre há outras medidas a serem tomadas. Por exemplo, quando lançou sua candidatura à reeleição, a presidenta criou um programa de desburocratização da atividade produtiva. Ainda há muito a se fazer para que o Brasil seja um país com menos documentos, menos burocracia e que exija menos tempo para a tramitação de processos no Poder Público.

DINHEIRO – O sr. participa da coordenação da campanha para a reeleição. A presidenta não vai anunciar seus planos para a economia em um possível segundo mandato, antes das eleições?
BERZOINI –
Ela vai apresentar suas propostas para o País em todas as áreas. Na economia, já tem o trabalho do governo, em curso, e nossa avaliação é de que temos alcançado um bom resultado. Temos impedido uma depreciação da massa salarial, do salário mínimo e do emprego. Isso, para o empresariado, significa mercado interno, que assegura demanda.

DINHEIRO – Nas eleições anteriores, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidenta Dilma colocaram a reforma tributária como prioridade. Esse discurso, hoje, só é visto entre os candidatos da oposição. O PT desistiu de fazer essa reforma?
BERZOINI –
A grande reforma tributária brasileira passa pelo pacto federativo, que envolve tributos, competências e prerrogativas. O tributo mais distorcido do Brasil é o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é arrecadado pelos Estados. Sem reforma do ICMS, teríamos uma reforma de mentira. Durante dois governos nós trabalhamos nesse sentido e esbarramos na oposição dos governadores. Esse é um dos objetivos deste governo, mas não queremos iludir as pessoas dizendo que reforma tributária é algo genérico.

DINHEIRO – O governo abandonou o tripé macroeconômico, baseado no regime de metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário?
BERZOINI –
Além de olhar para juros, câmbio e contas, o governo tem metas de emprego e renda dos trabalhadores. Temos de olhar para o PIB social, onde o Brasil está muito bem posicionado. Hoje, temos o menor desemprego da história e 11 anos de crescimento contínuo da renda dos trabalhadores.

DINHEIRO – Uma das estratégias para controlar a inflação neste governo tem sido o uso dos preços administrados. Mas ela tem prejudicado as estatais, principalmente a Petrobras...
BERZOINI –
A Petrobras está tendo lucro. Talvez não o lucro que o mercado acionário esperava. Mas devemos deixar uma empresa estatal ao sabor do mercado ou combinar o interesse do mercado com o interesse público? A alternativa seria aumentar o preço da gasolina seguindo o preço do mercado internacional. Eu sou contra essa política. A Petrobras foi criada com dinheiro público para fazer a política de soberania energética do nosso país. Quando se fala que a empresa está com o caixa apertado, é porque ela investe. Essa é a questão que diferencia a nossa gestão de outras que gostariam de colocar a Petrobras a reboque dos interesses do mercado acionário e não da população.

DINHEIRO – Essa imagem de intervencionista do governo é correta?
BERZOINI –
É um governo atuante. O governo anterior ao do PT só cuidava da macroeconomia. E mal. O atual cuida da macroeconomia, da microeconomia, incentiva os bancos públicos a darem crédito com taxas menores, coloca o BNDES a serviço do emprego, a Petrobras a serviço da soberania energética no petróleo, a Eletrobras a serviço da soberania no setor elétrico e investe em novas fontes de geração de energia. É um governo que busca construir aquilo que está ao seu alcance. Tanto não é intervencionista que os setores financeiro, imobiliário e de consumo são regulados pelo próprio mercado. Onde que o governo interveio e distorceu o mercado? Eu não vejo.

DINHEIRO – O sr. tem sido um defensor da regulamentação da mídia, mas esse ponto foi retirado do programa de governo da presidenta Dilma. Esse tema não será tratado em um segundo mandato?
BERZOINI –
No programa, precisamos colocar aquilo que é consenso entre os partidos da coligação (PT, PMDB, PDT, PC do B, PP, PR, PSD, PROS e PRB). O PT defende a regulamentação como meio de garantia à mais ampla liberdade de expressão, sem nenhum veio autoritário ou intervenção no conteúdo. A Constituição já prevê a função social da mídia e os direitos do cidadão perante um setor econômico que muitas vezes tem distorções. Mas nem todos os partidos da base defendem isso, então não dá para colocar no programa de governo.

DINHEIRO – A reforma política é uma das prioridades?
BERZOINI –
Sim, mas com a compreensão de que ela não se faz só a partir do Legislativo e do Executivo. É preciso a mobilização da sociedade civil. A tendência de quem está no mundo político é quase sempre da inércia, que acaba levando à paralisia. Quem se elege pelas regras atuais acaba se acostumando com elas. Tem de haver um amplo processo de mobilização popular e as manifestações do ano passado passaram a sensação de baixa representatividade. Isso se responde com mais democracia, mais participação popular, acesso ao poder público e visibilidade. A internet é um canal maravilhoso para isso.

DINHEIRO – A derrota da Seleção na Copa pode afetar de alguma maneira a reeleição da presidenta Dilma Rousseff?
BERZOINI –
Historicamente, a população sempre soube distinguir bem o desempenho da Seleção e as eleições. É fato que antes da Copa havia uma cobrança enorme quanto à capacidade de os governos prepararem o País e as cidades-sede para receber um evento dessa magnitude. No entanto, o Poder Público e a iniciativa privada mostraram um resultado que pôde ser sentido no dia a dia do torneio, que teve mais de um milhão de turistas, pontualidade dos voos, transporte aos estádios, segurança e até a atuação da polícia na investigação de fraudes com a venda e repasses de ingressos. Não tenho a ilusão de que fomos perfeitos, mas o resultado para o Brasil é altamente satisfatório. Infelizmente, a Seleção esteve muito abaixo da nossa tradição, mas isso não afeta a decisão política dos eleitores.

Fonte: http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/entrevistas/20140718/pior-que-inflacao-desemprego-alto-arrocho-salarial/172876.shtml

sábado, 19 de julho de 2014

O PAPEL DO MARKETING E AS ELEIÇÕES









Com o término da Copa, esta semana, a população se voltará para as campanhas eleitorais. Os holofotes sairão das arenas esportivas e se direcionarão para a política. Na Copa é montada uma logística que conta com a participação de profissionais multidisciplinares interagindo para garantir o sucesso dos espetáculos, onde as grandes estrelas do acontecimento são os atletas. Nas eleições ocorre o mesmo.

Com a disputa eleitoral, entra em campo, também, todo um suporte de estrutura física e de pessoal. Participam desse universo de profissionais como consultores e assessores de imprensa, de relações públicas, de propaganda e publicidade, passando pelos experts em mídias sociais, entre outros, indo até os marqueteiros. Mas as campanhas já começaram - principalmente para aqueles que já exercem algum mandato, no primeiro dia de exercício do cargo que lhes foi confiado pelo eleitor.

O político eleito que, desde o início do seu mandato, organiza uma comunicação eficaz cria um capital de credibilidade da sua imagem para sua reeleição ou do sucessor de sua preferência. Em paralelo, os adversários em potencial mais profissionais já se prepararam para o embate nas próximas eleições se antenando nos possíveis deslizes dos seus oponentes desde o início dos seus mandatos.
Políticos preocupados numa comunicação profissional só na época da campanha tendem a ficar vulneráveis. Isso vale também para qualquer organização que busca especialistas em gestão de reputação quando estão enfrentando uma crise. E precisarão de um esforço de comunicação bem maior ,por não terem bases sólidas alicerçadas por uma política de comunicação anterior, qualificada, sistemática e permanente.

Com a Lei Federal 12.232, a contratação do serviço de comunicação corporativa, pelo poder público, ficou mais democrático e transparente. A Lei passou a exigir licitações específicas para agências de comunicação corporativa (antes eram subcontratadas via agências de publicidade) para exercer as atividades de assessoria de imprensa e relações públicas, onde se insere a figura do consultor de comunicação. A Lei valorizou, também, aspectos de competitividade em relação a preços, capacitação técnica e experiência em benefício das administrações públicas. Além de contribuir para uma maior transparência das próprias gestões.

Um trabalho anterior consistente de comunicação é providencial numa possível crise futura. Quando não se tem um trabalho de imagem planejado, propositivo e preventivo, a tendência é os gestores ficarem totalmente à deriva das variáveis externas. Nem sempre os “bombeiros da comunicação” conseguem combater o fogo sem que contem com uma mínima “estrutura anti–incêndio”, previamente instalada. As eleições podem ser vistas como um momento de crise, face às acirradas disputas eleitorais, onde as exposições negativas da imagem dos candidatos são praticamente inevitáveis.

Não se pode atribuir aos consultores de comunicação o peso da responsabilidade em evitar ou minimizar as crises. Os gestores públicos, ou candidatos e seus assessores diretos precisam ter sensibilidade para monitorar – e compartilhar com os profissionais de comunicação – não só as suas potencialidades, mas também as vulnerabilidades. Cabe, também, a esses homens públicos (e seus executivos) o papel de informar aos especialistas da comunicação qualquer sinal de possíveis crises. Às vezes a um palmo dos seus olhos… Sem esse conhecimento prévio (em alguns casos por falta de preparo dos próprios gestores) o êxito das ações desses profissionais fica comprometido.

A sinergia – em todas as esferas da gestão – com a área de comunicação é essencial para construção, manutenção e expansão de uma imagem institucional forte. A preparação de porta vozes (em todos os níveis da gestão), também é primordial para que se tenha uma comunicação uniforme, ágil e eficaz.

Conceitualmente, o consultor de comunicação também exerce a função de auditor de imagem: deve ser seu papel avaliar a imagem da gestão e sugerir medidas preventivas, corretivas e proativas. Na verdade esse profissional exerce uma espécie de “curadoria crítica de imagem” usando ferramentas como diagnósticos de imagem (com pesquisas qualitativas com os gestores e assessores), análise SWOT, entre outras. A partir daí delibera, em conjunto com gestores ações para aprimorar a comunicação. No entanto, nem sempre os gestores (ou candidatos) seguem essas etapas. Mas como o papel desse profissional é de ordem consultiva, qualquer ação – ou ausência dela – passa a ser uma decisão de responsabilidade do gestor público ou da campanha.

Cabe ao eleitor – hoje muito mais esclarecido – avaliar quem está correspondendo à imagem que ele projetara. Isso vale para os cargos majoritários, proporcionais e aliados de cada um dos candidatos.

Marcos André Borges é jornalista e consultor de comunicação. Possui curso em Gestão da Comunicação Corporativa pela Fundação Dom Cabral e é controlador da VSM Comunicação.

terça-feira, 8 de julho de 2014

DE CIMA DO PÉ DE CAJARANA


Por Romeu Duarte

Neymar
Se todo brasileiro tem entranhado, no corpo e na alma, um técnico de futebol cheio de manha e sacadas, em tempos de Copa do Mundo, e ainda mais, realizada no Brasil, essa mania eleva-se ao paroxismo. Mesmo atolado até as orelhas em trabalho, o cidadão sempre encontra tempo para matutar acerca da qualidade da seleção, dos jogadores que estão bem, dos que estão devendo, daqueles que poderiam entrar, dos que não foram convocados. No terminal, enquanto o ônibus não chega, a discussão sobre a melhor escalação, os nomes mais adequados para cada posição, quem deveria ir para o inferno só com passagem de ida. Já dando bandeira de ser portador da mesma síndrome e doido para meter a minha colher no angu verde-e-amarelo, estou aqui num pé e noutro com a solucionática para a problemática.
Salvo pela própria agilidade e por uma trave redentora, com a voz embargada pelas lágrimas de esguicho, Júlio César recuperou a confiança nacional após a batalha contra o Chile, aquela que quase nos mata de enfarte. Os dois laterais, Daniel Alves e Marcelo, sofríveis, não apóiam ou marcam como deveriam, deixando feéricas avenidas escancaradas em seus setores à mercê dos adversários. São apenas pálidas reproduções de si próprios no Barcelona e no Real Madrid, respectivamente. O duo de zaga, Thiago Silva (o capitão chorão) e David Luiz (este o verdadeiro líder), tem se havido satisfatoriamente, o que há muito não existia no nosso escrete. Mesmo assim, vez ou outra, batem cabeça. Saudades da fibra e da autoridade de um Carlos Alberto Torres, o capitão do tri, a chibatada seca selando o destino da Itália na final.
Nosso meio de campo é uma plantação de pepinos. Antes povoado por figuras cerebrais, geniais, infernais tais como Clodoaldo, Gerson, Rivelino e Paulo César Caju, organizadores de bloqueios, tramas e lançamentos, hoje, neste vasto latifúndio improdutivo, não há um cristão que chame para si a responsabilidade de tocar a bola, pará-la ou imprimir velocidade a ela quando se faz preciso. Paulinho, Oscar, Ramires, Fernandinho, Willian, uma chusma de volantes que adoram se esconder na hora do sapeca-iaiá. A exceção é Luiz Gustavo, cabra disposto que não perde a viagem nem enjeita serviço. Hernanes, uma boa opção ainda não testada. A bola está saindo direto do goleiro para o ataque sem passar pelo crivo dos homens da meia-cancha. Estariam fazendo falta Ganso, Kaká, Ronaldinho Gaúcho?
Lá na frente a coisa anda engrossando. Nesse setor atua nossa principal referência futebolística atual, Neymar, de quem, sozinho, sem ter com quem dialogar, a Canarinha tem dependido bastante. Daí a mão de peia que o garoto leva em cada partida. Até agora tem conseguido se safar, apesar do sumiço (junto com quase todo o time, aliás) no segundo tempo do último jogo. Fred tem sido uma decepção. Feito uma parede, a bola bate em seu peito e volta ao ponto de origem. Não joga sem bola nem abre espaços para a criação de jogadas. Hulk, o boi-de-piranha, tem ido decidido para o sacrifício, a perna direita só servindo para subir nos lotações de São Petersburgo e nada de afunilar para receber lances de profundidade. Ah, Rei Pelé, em qual desvão perdeu-se o teu exemplo, ou o de um Tostão, de um Jairzinho?
Resultado: uma ruma de boleiros, na linha média do gramado, sem saber o que fazer. A Amarelinha precisa largar mão dessa imagem de frita-bolinho e jogar como o fez na Copa das Confederações, um dos poucos momentos em que ela me encheu os olhos nos últimos anos. Proposta: aliar a criatividade e a irreverência brazucas aos rigores do futebol total. Escrevo esta crônica antes de Brasil x Colômbia, o risco que corre o pau, corre o machado. Ato falho: analisando a nossa pátria onzena, acabei homenageando o time de 1970, para mim o melhor de todos. Fato: o pebol de Pindorama é patrimônio universal, nos afirma como nação, é celebração, forma de expressão, saber e ofício e seu lugar é no coração do povo, para quem, como dizia Nelson Rodrigues, a mais sórdida pelada é de uma complexidade shakespeariana.

segunda-feira, 7 de julho de 2014

SECRETARIA DA MICRO EMPRESA E ARTESANATO

Por Joaquim Cartaxo


Por meio da lei federal n° 12.792/2013 foi criada a Secretaria da Micro e Pequena Empresa com status de ministério de estado com objetivo de assessorar a presidência da república na formulação, coordenação e articulação de políticas e diretrizes, programas, projetos e ações de incentivo, promoção de arranjos produtivos locais voltados para microempresas, empresas de pequeno porte e artesanato. Assessorar também na coordenação e supervisão de programas de apoio, articulação e incentivo à participação em exportações de bens, serviços e internacionalização.
Rio Grande do Sul e Distrito Federal seguindo o governo federal criaram secretarias semelhantes. O primeiro, a Secretaria da Economia Solidária e Apoio a Micro e Pequena Empresa; o segundo, a Secretaria de Estado da Micro e Pequena Empresa e Economia Solidária.
Em 2013, o Ceará instituiu o Estatuto do Micro Empreendedor Individual, da Micro Empresa e da Empresa de Pequeno Porte que estabelece normas gerais de tratamento diferenciado aos microempreendedores individuais, às microempresas e às empresas de pequeno porte.
Dados do IPECE apontam que no Ceará, entre 2007 e 2012, houve um crescimento de 124% do número de Micro Empresas e Empresas de Pequeno Porte optantes do Simples Nacional. Esse incremento conferiu ao estado a segunda colocação no nordeste e a nona posição no Brasil em quantidade desses estabelecimentos, que albergam atividades de produção de bens e serviços.
Há portanto no Ceará ambiente favorável à expansão de Micro Empresas e Empresas de Pequeno Porte. Assim sendo, é oportuno um diálogo proativo sobre medidas mais dinamizadoras desse ambiente em que se propõe a criação de uma secretaria estadual de apoio à micro, pequena empesa e artesanato, com a finalidade de auxiliar o governador na formulação, implantação e avaliação de políticas, programas, projetos e ações voltadas para apoio a criação e expansão dessas empresas.

Fonte: jornal O POVO de 7 de julho de 2014.


terça-feira, 1 de julho de 2014

A CIDADE POSTA À MESA


Urbanizaçao Vila do Mar - bairro Pirambu, Fortaleza/CE  




 Por Romeu Duarte

Se a cidade é uma coisa complexa e complicada, o saber/fazer que lhe estuda e aborda fisicamente, o urbanismo, não o é menos. No mundo ocidental, construídas ao longo dos séculos e ao sabor dos eventos por mãos leigas e eruditas, as cidades só se tornaram um objeto de conhecimento específico no alvorecer do século XX, quando Ildefonso Cerdá, o criador do ensanche de Barcelona, deu um nome e um estatuto a esse ofício. Até então, elas se reproduziam nos mundos Velho e Novo em seus caminhos, marcos, articulações, barreiras, limites e bairros, modelo tradicional do fazer urbano descendente da trama hipodâmica e do cruzamento do cardus com o decumanus. A herança do desenho ancestral mora no corpo e na alma de toda e qualquer urbe, grande, média ou pequena.

Mas, a essa altura, a cidade já se transformava em monstro na fumaça da Revolução Industrial. Novos meios de transporte, vias rasgando o antigo tecido citadino, o êxodo avassalador de levas e levas de gente do campo, as fábricas e os bairros operários, as favelas e as áreas chiques. Segregação, espoliação, exclusão, apartação, maldição. O urbanismo modernista vai recortar as cidades em zonas de trabalho, habitação e recreação, unidas pelo autorama rodoviarista da circulação. O planejamento urbano e seu corolário, o plano diretor, surgem como panacéias abstratas para todos os males das aglomerações humanas, deixando em último plano, calado e esquecido, seu pretenso beneficiário, o habitante. Hoje, em tempos líquidos como querem alguns, a cidade se faz do medo dos que temem ficar para trás.

Diria Fortaleza: “E eu com isso, caixão de lixo?”. Um forte arruinado em meio a um imenso areal, poucos sobrados, tantas choupanas, uma mera hipótese geográfica, foi esta a imagem de nossa capital por muitos e muitos anos. O algodão escoando pelo seu porto no século XIX trouxe-lhe a Belle Époque, deu-lhe modos e maneiras afrancesadas, construiu-lhe a Praça do Ferreira e o Theatro José de Alencar. Toda essa belezura estanca nos anos de 1930 com a industrialização e a periferização da cidade, Jacarecanga e Arraial Moura Brasil, Aldeota e Pirambu. A Loura irreverente e anárquica, avessa a planos e idéias amplas, cresce, incha, se muda em metrópole descapitalizada e dividida, cidade leste rica, cidade oeste pobre. Nos dias que correm, densa e desigual, feia e violenta, ela nos convida a decifrar seus intricados enigmas.

Numa palavra: a cidade é a maior invenção do homem. Tem cheiros, sabores, sons, texturas, jeitos, aspectos e detalhes, num todo que é maior que a soma de suas partes e permeado pela memória. Dela aproveitamos, como diz Ítalo Calvino pela boca de Marco Polo, a resposta que dá às nossas perguntas. Aliás, quem sabe se as seis propostas para o novo milênio que o escritor cubano-italiano, no apagar de suas luzes, apresentou como norte à literatura não sirvam também, da mesma forma, ao urbanismo? Decerto, nossas novas formas de viver estão a exigir leveza, rapidez, exatidão, visibilidade, multiplicidade e consistência, o que aproxima a arte de reunir palavras em busca de um sentido daquela sua outra irmã que procura o mesmo fim, articulando espaços, fluxos, economias e pessoas.

Eram esses os temas que animavam a conversa daqueles arquitetos, sentados em círculo no escritório simples, instalado no alto edifício varado pela luz vespertina. À frente de todos, representada num mapa multicor com suas virtudes, defeitos, potenciais, ameaças e perspectivas, a matéria de sua atenção, como profissionais e cidadãos-moradores, jazia plácida e desafiadoramente sobre a mesa de madeira e vidro. A ambiciosa tarefa de compreendê-la e nela intervir já havia consumido rios de tinta e florestas de papel. Quanto mais cansados, mais motivados, pois a cidade é uma mulher que quer sempre o melhor dos seus amantes. As primeiras estrelas decretaram o fim daquela reunião. Despediram-se calorosamente com a promessa de um breve novo encontro. Lá fora, a vida era um longo texto não verbal.

 Foto: Divulgação/Ministério do Planejamento