terça-feira, 26 de novembro de 2013

O FAROL TATUADO

Por Romeu Duarte

Farol do Mucuripe, Fortaleza, Ceará, 1940 - Arquivo jornal O Povo


Os escravos me levantaram em meados do dezenove sobre este morrote aqui no Serviluz, sobranceiro sobre o mar e o resto da paisagem da jovem cidade. Construíram-me robustamente neoclássico, minhas paredes de alvenaria grossas de mais de metro, minha planta em octógono, as ameias me dando um ar de castelo. Durante décadas a fio fui segura referência para muito sujeito desnorteado na selva marinha. Tanta nau orientei, tanto barco salvei do naufrágio iminente, o sorriso de alívio dos comandantes e dos pobres marujos. Entretanto, há tempos estou cego. Tem para mais de cinqüenta anos que perdi a luz do meu olho, tiraram-me a tocha de guardião do oceano, aposentaram-me do meu mister. Hoje sou apenas um prédio sobre uma duna, e como dói.
Lembro-me dos meus dias de glória. Elegeram-me símbolo arquitetônico da capital e do estado, minha efígie se encontra no brasão e na bandeira deste Ceará velho de guerra. Ganhei canção bonita do Ednardo e um belo quadro do belga Georges Wambach. A admiração chegou a um ponto tal que, depois de aposentado, transformaram-me em museu e me tombaram como patrimônio histórico. Claro, fiquei orgulhoso, não é qualquer edifício que vira monumento, lugar de memória, da noite para o dia. Se antes era um marco para quem vivia nas ondas, hoje sou, com licença da palavra, bem imóvel protegido. Chique, não? Que nada, quem tiver coragem de me fazer uma visita vai encontrar um triste cenário, de dar dó, de sentar na coxia e verter mil lágrimas de esguicho.
Carrego a má sina do bairro que se me presta de chão. O abandono, a negligência e o desprezo que devotam à gente que resiste aqui são também sentidos por mim. Zona de povo pobre, não vai lá que é perigoso, maconheiro do Titanzinho, rapariga do Farol. A função cultural que cerimoniosamente me reservaram acabou-se, não sirvo mais para nada. Cercado de casebres e tendo como parceiro de infortúnio o arranque de um fortim colonial, estou cheio das mazelas das construções antigas e mal cuidadas. Com as portas sempre escancaradas, sirvo de abrigo aos amores clandestinos e às vítimas dos desarranjos intestinais. Minha espinha dorsal, a escada helicoidal em ferro forjado, comida de ferrugem e sal. Quem deveria zelar por mim só se esquiva.
Hoje de manhã fui acordado por uma algazarra dos diabos. Gente jovem e ruidosa, cabelos ao vento, idéias nas nuvens. Sobre andaimes e com sprays nas mãos, cobriram-me de grafites escuros, guirlandas, barcos, seres imaginários. Sorrindo, dizem que assim prestarão mais atenção em mim, me resgatarão do esquecimento, me recuperarão. Negrada, grato pela força e pelo bom mocismo, mas, como prédio, e tombado, careço de outros carinhos, bem mais adequados e urgentes. Minha natureza é proteger, dar forma a uma função. Restaurado e posto a serviço de um novo e útil uso, tanto poderia ajudar as pessoas daqui, colorindo suas vidas cinzentas. Essas tatuagens ficarão como marca de uma ação bacana ou de um ato inconveniente e ilegal?
Idos os meus pretensos benfeitores, resto na minha mesma melancólica situação, agora vestindo esta nova e berrante roupa que briga com a minha austera modinatura. Ah, Terra da Luz, mãe da marmota. A noite cai, as estrelas surgem no salão do céu, a lua se insinua por entre as nuvens. Aqui é ruim, mas é bom, perto da praia e com a brisa a favor, só falta melhorar. Esses passos a esta hora, quem vem lá? Não acredito, são pichadores e já deram início às suas atividades, subindo por minhas paredes, galgando a minha torrinha, gravando em mim seus rabiscos em sua agoniada coreografia. Meu corpo de pedra e tijolo, um palimpsesto de garatujas incompreensíveis e boas intenções artísticas. E então, amigo, sou patrimônio de todos ou Casa de Mãe Joana?

Fonte: jornal O POVO, 25 de novembro de 2013 e http://fortalezanobre.blogspot.com.br/
 


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

NOSSO AGRADECIMENTO É A LUTA.

Por Genoino, Zé Dirceu e Delúbio





URBANISMO ECOLÓGICO

Por Joaquim Cartaxo

Parque Namba - Localizado em Osaka, Japão, este ousado projeto de um parque de terraços foi laureado como um dos quatro melhores em todo o Pacífico Asiático pelo concurso do Urban Land’s Institute (ULI) – 2009 Awards of Excellence.



Urbanismo ecológico é desenhar a cidade com a natureza. Sua teoria e prática relacionam tópicos que são essenciais como caminho a ser trilhado na busca da melhoria das condições de vida e trabalho da população. 

Adensamento de pessoas e atividades com espaços públicos para congrega-las é um desses tópicos. Fundamental para construção de cidades sustentáveis, o adensamento cria possibilidades de ampliar as áreas permeáveis, produzir área verdes com vegetação de preferência nativa e contribuir para biodiversidade; amplia possibilidades de deslocamento a pé e consequentemente proporciona menor necessidade de transporte individual; permite maior aproveitamento da infraestrutura, espaços livres, equipamentos, comércio e serviços. Assim, se constroem cidades compactas que crescem para dentro delas no lugar de cidades espraiadas, difusas que crescem para todos os lados.

Outro tópico é reconhecer os processos naturais, geológicos e hídricos, no trato das questões urbanas, priorizando nos projetos de arquitetura e urbanismo elementos como energia limpa gerada pelo sol, ventos e resíduos orgânicos; coleta e reciclagem de águas das chuvas; reutilização de edificações existentes; uso de instalações reversíveis, adequáveis a situações imprevistas, não programadas.

Da mesma forma, criar ambientes urbanos produtivos voltados para produção de alimentos e reaproximação das pessoas aos processos naturais por meio da construção de hortas em canteiros, tetos, ruas e lugares abandonados por exemplo. Tais ambientes precisam estar relacionados no planejamento urbano ambiental e socioeconômico. 

O urbanismo ecológico propugna que a estruturação urbana baseada no sistema viário deve ser substituída pelo traçado dos recursos hídricos. Assim sendo, eles inevitavelmente serão preservados, no lugar de emparedados. Os rios e lagoas passarão a ser vistos e as pessoas serão reconectadas com sua paisagem.

Fonte: 
Jornal O POVO, 18 de novembro de 2013
Foto - http://arquitetogeek.com/2009/10/21/20/

FOTOGRAFIAS SOBRE A MESA


Por Romeu Duarte


Estoril em 1943 sendo usado como Clube de Veraneio por soldados   


A Jacques Antunes

E eis quando não há nada a fazer, nada mais a dizer, a tarde caindo como uma sentença de morte, o envelope com fotos de tempos longínquos cai de uma prateleira qualquer e muda o rumo da vida. Não pense que isso é mera obra do acaso; são os planos do destino, milimetricamente determinados, intervindo no presente pela via do passado e mandando lembranças ao futuro. Que tudo pare, que todo o aperreio cesse, que há algo mais importante a cuidar. Rostos, expressões, roupas, adereços, o que estaria dizendo, com tanta ênfase, essa menina de cabelo encaracolado aí? Tantos anos em cada fotograma, olhos e bocas tão graves, a memória simplesmente não ajuda. Só sei que deve ter sido algo muito importante naquele momento, eternizado no instantâneo sépia.
A mãe e o pai brincando com o primogênito roliço, os olhos claros e acesos. A alva fralda drapejada, o boné maroto, os dedos da mão esquerda todos enfiados na boca. Agora o menino ensaia os primeiros passos, o riso desdentado mangando dos perigos a cada pisada. A hesitação entre o velocípede e o cavalinho de pau, o macacão cáqui. Sim, minha filha, você parece muito com ele, como não? O piso da casa era em mosaico xadrez, dava para jogar damas com os gatos e os sapatos. Aqui já era no Cocorote, o cheiro forte do combustível dos aviões que davam rasante sobre as nossas cabeças. Os pivetes ajuntados em escadinha, os terninhos e o corte Príncipe Danilo. Não, não tínhamos vergonha, era assim que a infância, incauta, acontecia.
Uma solenidade no colégio, quem sabe, as Olimpíadas. As turmas foram todas fotografadas, ai de quem faltasse nesse dia. Como existir hoje sem esse instante lá atrás? Esses dois aí morreram pouco tempo depois, esse fugiu de casa, nunca mais foi encontrado. O magro de óculos, logo se vê, sempre foi safado, vive até hoje aprontando. O da esquerda, de camisa de gola alta, puxava uma perna, ninguém reparasse, pois ele zangado era um bicho. O da frente, de pastinha, já quebrou quatro vezes, pobre sem sorte. Sou o da juba desgrenhada, certamente rindo de uma piada contada pelo varapau da direita. O irmão que distribuía santinhos e simpatia, mais tarde morto no desastre do elevador. É isso mesmo, minha filha, para ir para o outro lado, basta estar vivo.
Reunião de artistas no Estoril, fim da década de 1970. As canções suspensas no ar salgado, a cerveja quente, os cachorros entrando e saindo do salão. Fisionomias sérias, certamente manchadas de ideologia. A moça que ficava bonita quando tinha acessos de ira. Muitos bigodes e barbas, cabeleiras fartas, muita pele exposta. O Theatro José de Alencar lotado, velas na escuridão, a grande feira-show que até hoje, massa, ressoa. Os bares que se sucederam na voragem etílica, as festas de aniversário, as passeatas embandeiradas, os casamentos desfeitos, taí um cara gente fina, câncer, não deu outra. Esse time de futebol tanto apanhava quanto davam nele, o herói dos subúrbios, cada jogo era uma camisa, tinha todas as cores e nenhuma, o goleiro, coitado, era cego.
Tanta coisa, tantas caras, tantos ambientes sobre desgastadas panorâmicas. Tanta esperança nos dentes risonhos, tantos gestos confiantes, tantos beijos e abraços. Tanto mau sentimento escondido também, ou em germe e depois aflorado. Fotografia é fogo, faz pensar e sentir, nos situa no tempo, dá sentido à nossa existência, mesmo que não façamos a menor idéia do que estávamos fazendo ali naquele átimo. Não importa, a luz nos registrou a carne sobre o filme, é o que há, a prova do crime da vida vivida. Sensações reveladas, saudades de quem ou do que não existe mais, surpresa de um momento bom, lembrança de uma quadra ruim. Súbito, a menina, cheia de tanta imagem: “Que máquina faria esse álbum, pai, se ele fosse feito na contramão do tempo?”.

Fontes: 
jornal O POVO, 18 de novembro de 2013; 
foto - http://fortalezanobre.blogspot.com.br/search?q=Estoril

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

CIDADE, MARMOTAS E MEMÓRIA


Por Romeu Duarte




Ao Geraldo e aos amigos da Base

Cidade é bicho esquisito. Você pensa que a está apenas usando quando, na verdade, está estabelecendo uma relação de amor e ódio com ela. Experimente passar um tempo longe dos seus sortilégios. Na volta, muitas serão as reclamações quanto às mudanças que fizeram sem lhe consultar, os muitos prédios que derrubaram, os jardins transformados em desertos, a casa da antiga namorada convertida num centro comercial. Dirão uns: “Besteira, tu queria bem que tudo ficasse do jeito que era?”. Claro, a cidade, mormente a metrópole, é um ser vivo, num constante processo de expansão e transformação. Doido é quem tenta impedir esse fluxo. Mesmo assim, como ficamos aqueles que têm o seu umbigo enterrado num lugar de memória?

Sei que é difícil, até impertinente, falar dessas coisas tendo Fortaleza como referência. Parece-me que a tradição de nossa urbe é abdicar de toda e qualquer tradição em favor de reluzentes novidades, comportamento de quem tem sempre uma mercadoria nova nas gôndolas para oferecer. A sedução pelo novo e por aquilo que é de fora cala toda e qualquer reverência ao passado e impede a conformação de um modo de vida próprio, como se estivéssemos condenados a um presente de imitação e a um futuro destituído de traço civilizatório. Esse é o sentimento que me assalta quando ando, por exemplo, pela Aldeota, ao ver suas lojas anunciando “on sale”, “50% off”, ou até mesmo pelo Montese, com seus “kings”, o idioma pátrio indo conosco pro beleléu...

Ruminava esses assuntos a bordo de um uisquinho, no bar favorito, enquanto aguardava uns amigos que foram meninos comigo na Base Aérea de Fortaleza. Como estariam eles agora? Ainda conservavam a verve e a molecagem como características? Alguns deles não via há décadas, suas imagens ainda juvenis na minha já desgastada lembrança. E pensar que iniciamos nosso conhecimento do mundo e aprontamos todas aquelas marmotas numa unidade castrense e em plena ditadura militar...Para nós, a Base era um brinquedo. Passamos batidos pelo clima de opressão política porque havia rachas a jogar, arraias no céu a cortar, corridas de rolimã para competir, quintais a explorar, essas coisas que fazem a vida valer a pena.

Vão chegando aos magotes, zoadentos e animados. Uns não mudaram quase nada ou muito pouco; outros, só com o exame de DNA para reconhecer. Carecas, grisalhos e barrigas salientes, quem diria que aqueles garotos iriam um dia ficar assim? E toca a lembrar das muitas presepadas, a adúltera doida pelo rapazote malino, a menina linda na festa de São João, o sargento nu fugindo da polícia numa lambreta, o incêndio que ateamos no Aeroclube, a surra que quase levamos de um time de várzea, os torneios de futebol disputados a tapa, a brincadeira que por pouco não gerou uma operação de guerra, os que se foram, os que estão indo, os que permanecem. As mulheres, noivas e namoradas em bocejos mil, que memória dos outros é uma chatice...

Bocado bebido, comido e conversado, acampamentos levantados, longas e calorosas despedidas, a promessa de em breve nos revermos, cada um para o seu canto. Na volta para casa, no táxi, indago-me: “O que faz pessoas tão distintas, de interesses tão diversos, manterem essa chama tão acesa?”. Ao meu lado, esquecido por alguém, um jornal traz a notícia da possível desativação da Base Aérea de Fortaleza. Fecho os olhos e fico a lembrar daqueles espaços, da arquitetura monumental dos edifícios (que depois descobri ser da autoria de Emílio Hinko, o mesmo do Castelo do Plácido, de triste sina), do que vivi ali. A ser verdade, o que dela será feito? No destino, pago a corrida e escuto o motor de um avião, perdido na noite, assim como eu.

Fonte: jornal O POVO, 11 de novembro de 2013.
 

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

DOCES SONHOS ENCARACOLADOS

Por Romeu Duarte




À Emília, com um beijo

Olhos sonolentos, o costumeiro mau humor matinal (ampliado), o cabelo castanho em cachos caindo sobre o rostinho cheio, o suco de laranja aguardando no copo para ser bebido, minha menina, em que galáxia o teu pensamento? Ontem eras apenas um bebê sobre uma toalha grená dando gargalhada para o fotógrafo sob um jovem ipê no Parque do Cocó. Hoje, logo mais, decidirás o teu destino profissional nas longas horas de uma prova que farás em um colégio que mais parece uma prisão. Quanta responsabilidade para tanta juventude. Responde com um amuo a minha pergunta. Melhor deixá-la em paz, concentração agora é tudo. Súbito, espirros mil. Nem provou as torradas com geléia de morango, a idéia em algum furtivo paralelogramo.
A mãe, desvelada leoa, já cuidou de tudo. Os documentos, a carteira de identidade, a água mineral, o lanche de frutas e barras de cereal, tudo envolto em um saco plástico. Que tema terão escolhido para a tua redação? O berro rouco e ensurdecedor das ruas, a exploração do pré-sal, a mobilidade social dos 40 milhões de ex-pobres? Neste momento, absorta, dedilha no violão do pai uma canção da Norah Jones. A voz sai pequena e afinada, serpenteando entre os acordes. A irmã pequena, viperina, diz que ela já deveria estar pronta e que o teste que ela vai fazer não é para cantora. É o bastante para um candente conflito fraterno, logo apartado pelos pais. Num pinote, vai ao banheiro para as abluções. Ai, a água do chuveiro sobre o ácido da menina...
Sai do banho esplendorosa, o corpo roliço, alta e empinada, minha garota, minha boneca, minha gata. Já, já, vai aparecer por aqui, se é que ainda não deu o ar da graça, um papangu metido de olho grelado. Ciúme de pai, besteira besta, mas que incomoda, ah, nem queira saber. A blusa do colégio, o jeans apertado, o tênis vermelho. A tira no cabelo revolto amarrará seus sonhos? Não, que sonho é coisa que não se deixa amarrar. No carro, a caminho da luta, vai calada e grave, trocando mensagens com seus amigos numa silenciosa algazarra virtual. Ah, minha menina, tanto que a vida ainda te reserva! Seu olhar percorre as ruas vazias da Aldeota domingueira, o coração, um sólido euclidiano, um lance de dados jamais abolirá o quadrado da hipotenusa...
A longa fila de jovens almas sob o sol escaldante, o suado retrato da esperança. “O senhor é aquele que escreve no jornal? Se ela puxou ao senhor, então está no papo”. No da minha filha ou no da dele, elogio ou sarcasmo? Nada de provocações, bola pro mato que o jogo é de campeonato. A torturante volta do ponteiro do relógio: leia bem o enunciado da questão, a solução está nas entrelinhas, mãe, estou sentindo um frio na barriga, que nada, menina, é só impressão, vai dar tudo certo, e se não der, não se preocupe, já fiz vestibular com um olho só, papai, o senhor é o melhor mentiroso do mundo, o portão abriu, um renascer, uma travessia para outra etapa da vida, revise tudo no fim, Deus te guie, seja feliz, que a força esteja com você, passarinho.
Ah, Mallarmée, poeta querido com quem brinquei lá atrás, tens razão: "os sonhos têm tanta força quanto as ações". Desejo sem gesto não tem futuro. Lá vai ela, graciosa, tão valente e tão criança ainda, quão severa esta hora, os passos curtos por entre a multidão de gladiadores, a mãozinha espalmada balançando, o olhar confiante, o sorriso encabulado, sua face cada vez mais distante, a roupa colorida já quase imperceptível, agora ganhando a galeria, subindo a escada, a prova é no quarto andar, o jeito é aguardar, dessa forma é que eles viram gente, que filho é para o mundo, não é para nós, é isso mesmo, enxuga a lágrima, é sempre assim, aceita um cafezinho, um cai-duro, não, obrigado, pois é, o senhor escreve bonzinho, só que torce pelo time errado...

Fonte: jornal O POVO, 4 de novembro de 2013.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

O RIO E A CIDADE

 
Por Joaquim Cartaxo


 Rio Cocó/Ponte Sebastião de Abreu


Os processos de urbanização e fluviais possuem relações conflituosas  que se expressam, por exemplo, na visão do rio como estrutura de saneamento e drenagem; na ocupação inadequada ou irregular das margens dos recursos hídricos; nas águas funcionando como coletora de lixo, de efluentes domésticos e industriais; nas cidades invadindo as águas e as águas invadindo as cidades.



Há ainda os rios que desaparecem na paisagem urbana. Em Fortaleza, asfaltaram a nascente e a foz do riacho Pajeú, às margens do qual a cidade nasceu;  emparedaram o rio Aguanambi em um canal de concreto e criaram vias em suas margens; o rio Cocó é alvo de conflitos entre grupos imobiliários, proprietários de terrenos às suas margens, e grupos ambientalistas que lutam pela preservação desse recurso hídrico.



Sobre o Cocó: rio metropolitano com 45 km de curso; nasce na serra da Aratanha em Pacatuba, deságua nas praias do Futuro e Sabiaguaba; sua bacia hidrográfica em Fortaleza banha 2/3 do território da capital do Ceará; é influenciado pelas marés entre sua foz e a BR 116, onde seu manguezal marca a paisagem de sua orla fluvial de forma exuberante; de um lado e outro do rio a cidade cresceu, sem conexões que atendam a demanda de deslocamentos das pessoas; as pontes da avenida Engenheiro Santana Júnior, da Sebastião de Abreu e da Sabiaguaba são insuficientes e inadequadas do ponto de vista urbanístico, pois não garantem conforto e segurança quanto acessibilidade entre os setores urbanos das margens direita e esquerda do rio.



Equacionar a preservação do ecossistema do rio e o crescimento da cidade requer criterioso estudo rio Cocó, amplamente debatido com a sociedade, com o fito de se desenhar a paisagem urbana a partir da água e integrar os setores referidos. Isto é um desafio e uma oportunidade para que a cidade de adeque ao rio e o rio se adapte à cidade, pois o destino de um está preso ao da outra.





Joaquim Cartaxo é arquiteto urbanista e vice-presidente do PT/CE

Fonte: jornal O POVO, 4 de novembro de 2013.